segunda-feira, 1 de junho de 2009

Tornado.

Estava preso a um poste quando apareceste. Em vez de me soltares ficaste-te a rir de mim. Às tantas o que me prendia soltou-se, agarrei-te pelas entranhas. Estavam vazias. Não tinhas nada contigo, a tua própria presença acabou por se tornar ineficaz, desprovida de sangue. Por instantes as pontas dos nossos dedos tocaram-se, rendi-me aos pedaços de vácuo que oferecias então.
Não, não estava destinado a durar, a fornalha que havia em mim ardeu como mil sóis, acabando por consumir o teu eu cá dentro. Ardi também. E postes à parte, tu, sim, tu. Tornaste-te no vácuo que oferecias, talvez já o fosses, é provável que os meus olhos te tenham alterado.
Há dias em que acordo, podre, ainda sinto o cheiro dos teus olhares furtivos, esperneando no ar que me sufoca.
Posso soar odioso, e sou, mas senti-te tão fundo, deixaste tudo com laivos de insatisfação. Dei-te a minha catarata e tu sonhaste destruí-la, sem te aperceberes que acordada a estraçalhavas. Nesses ataques de falso sonambulismo queimaste-me as pontas, sacrificaste-te dentro de conchas infinitamente pequenas.
Ancorado ao meu desolamento, dormente de suplícios infundados afoguei-me em lava fundente, fraco e fragilizado, fruto de nada e de tudo, contradizendo-me em todas as direcções, ser não sendo. Atingindo a leveza da existência sem dar demasiada importância ao sentido. Divido-me a nível intra-molecular, sub-atómico.
Anatomicamente não faço sentido, a dada altura deixei o meu coração crescer demais. Ao tê-lo feito condenei-me a viver assim, imerso no amor que professo.